
Manual de comunicação de moda sustentável: fetichização do consumo por jornalistas e influenciadores é colocada em xeque pela ONU
ONU cria Manual de Comunicação de Moda Sustentável para incentivar práticas conscientes entre mídia e leitores e mobilizar uma nova perspectiva sobre consumo
Mais do que apenas produtos inovadores ou discursos idealistas de um futuro possível e melhor, a sustentabilidade na moda (e na vida!) precisa ser um modelo de pensamento coerente, consistente e perene para se fazer uma verdade possível. Diante deste contexto, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) lançou, recentemente, o Manual de Comunicação de Moda Sustentável, com o qual pretende fazer um movimento com jornalistas, influenciadores e profissionais de marketing da área de moda para mobilizar a conscientização de práticas e consumo.
Se as revistas, marcas e perfis de influencers nas redes sociais disseminam o conceito de moda, logo não se pode ignorar a importância destes atores sociais na dinâmica (que deve ser urgente) sobre o consumo de itens do segmento.
Por que um manual de comunicação de moda é um avanço?
A explicação para a iniciativa de uma ação voltada para formadores de opinião é que a centralidade de um consumo consciente não está apenas na produção e inovação de um produto mais sustentável. Pelo contrário, quando o assunto passa pela temática sustentabilidade, é inevitável que haja uma mobilização social e coletiva.
E é justamente aqui que entra a importância de se mudar a forma de como a comunicação, imagem e notícia de moda são apresentadas ao consumidor final.
Na cartilha, sugere-se que haja um comprometimento na forma que se estimula o consumo desenfreado. Porém, mais do que explorar o que já se sabe sobre os desafios da sustentabilidade na moda em números, ou falar das regras do novo manual, a reflexão tem que ser sobre a estrutura do pensar e agir sobre sustentabilidade em um mundo culturalmente constituído pela ordem do consumo.
E parece que aqui voltamos ao tempo e nos deparamos com pensamentos marxistas em torno da fetichização da mercadoria. Explico: o que a ONU tenta revisitar, em seu manual em forma de convite a uma mobilização frente ao consumo de moda, esbarra exatamente na forma de como se estabeleceu, numa época pós-revolução industrial, a relação do indivíduo com uma mercadoria.
É o desejo por um produto além da função, é a transferência de valor intangível e simbólico para algo que deveria ter apenas o preço e o uso diante da sua função. Nada mais do que isso.
Corta a cena. Voltemos para a sociedade atual que se relaciona com consumo simbólico e busca por diferenciação a cada item adquirido em uma prateleira ou selecionado em uma vitrine com a última tendência. Ou seja: operamos pelo desejo do novo, buscando em nosso consumo de cada dia algo que nos oriente e nos motive para viver a vida que desejamos levar.
O consumo na nossa sociedade não é descartável, por isso, o manual da ONU se faz coerente. Cerca de 140 empresas já aderiram ao projeto em busca de um comprometimento maior com o meio ambiente e com os trabalhadores da indústria têxtil. De forma geral, entre os principais pontos de ação que o material traz são:
- Liderar a comunicação de uma marca de moda de forma consciente sobre os impactos ambientais;
- Incentivar que as marcas mostrem mais os seus processos internos de forma transparente e que as revistas apresentem mais as marcas que estão alinhadas com o meio ambiente;
- Promover o combate à desinformação sobre o processo de produção da indústria têxtil;
- Disseminar a ideia de que roupas devem ser usadas mais do que uma vez;
- Não estimular o consumo excessivo ou a obsolescência programada;
- Mudar as narrativas das comunicações de marca e notícias que estimulam o consumo e descarte excessivos
Como já dissemos anteriormente por aqui, em coluna publicada em março deste ano: mais do que práticas fragmentadas por parte da indústria ou pela inovação de produtos sustentáveis, a sustentabilidade é um modelo de pensamento, que deve transbordar para uma consciência coletiva do consumo no dia a dia. E mais: é sobre a nossa relação responsável por um planeta que pede socorro.
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