Conheça o coletivo de estilistas negros que atua pela representatividade na moda
Célula Preta é um projeto nascido dentro da Casa de Criadores e integra estilistas negros que promovem ações pela igualdade de oportunidades no mercado | Fotos: Weider Silveiro, Jal Vieira e Fabio Costa, estilistas do Célula Preta | divulgação Casa de Criadores
2020 pode ser lembrado também como o ano em que o racismo bateu de frente com uma parede sólida: o posicionamento e ação de pessoas negras, que deram um basta e exigiram seu lugar na sociedade. E foi em um período aquecido deste ano que surgiu no Brasil uma iniciativa única, a Célula Preta, coletivo de estilistas negros da Casa de Criadores.
“NÃO É SÓ SOBRE RACISMO”
O projeto surgiu em junho para promover ações e debates sobre a diversidade no mercado da moda. O combate ao racismo, segundo André Hidalgo, diretor criativo da Casa de Criadores, é urgente neste segmento.
“E não é só sobre o racismo, mas questões de gênero também, além de várias outras pautas identitárias. A moda está repensando muito todas essas questões (já estava mais do que na hora) e a Casa de Criadores, na verdade, sempre fez isso de maneira muito orgânica. Teremos um mundo cada vez mais inclusivo e justo, tenho certeza disso. É um movimento sem volta”, afirma André.
QUEM FAZ PARTE DA CÉLULA PRETA?
O coletivo integra estilistas brasileiros negros que já fazem parte da Casa de Criadores: Hisan Silva e Pedro Batalha, da marca baiana Dendezeiro, Fábio Costa, da NotEqual, Diego Gama, Jal Vieira e Weider Silveiro.
Para André, as perspectivas são boas em relação aos insistentes casos de racismo atuais. Perguntado como enxerga o mercado daqui cinco anos, ele é otimista. “Acho que estilistas negros já estarão totalmente integrados e terão conquistado seus lugares de direito. O talento vai ter cada vez mais espaço e será o que irá determinar o sucesso de uma marca e/ou estilista”.
Nós batemos um papo com o Hisan Silva sobre a iniciativa e o desafio de lutar contra o racismo no Brasil. Confira:
SdA: A Célula Preta surgiu em junho deste ano. Quais foram as grandes motivações para a iniciativa?
HS – Promover discussões de equidade, trazendo mais da vivência do corpo preto na sociedade, para que todos do evento possam pensar isso no âmbito pessoal e assim trazermos essas mudanças de uma forma intencional. O coletivo surgiu do incômodo do cenário social do racismo no mundo, quando George Floyd tinha sido assassinado e o movimento Black Lives Matter estava ganhando cada vez mais força. Vimos aqui no Brasil também delatores de abusos a profissionais pretos do mercado da moda e entendemos que mesmo em pontos de diferença em nossas trajetórias profissionais, criadores pretos atuam em defasagem em um mercado estruturalmente racista.
Então, formamos um grupo para discutirmos e entendermos melhor esse sistema, aumentando assim não só o alcance da nossa voz, mas estendendo também este pensamento que enxerga alguma rede de profissionais pretos que precisam de mais acesso, visibilidade e remuneração.
SdA – A CP terá um papel apenas dentro da Casa de Criadores ou irá atingir diretamente outros eventos, empresas e pessoas?
HS – Conseguimos implementar que pelo menos 50% do casting seja de pessoas pretas. Para além da Casa, o coletivo está atuando e ganhando espaço em outras frentes. Graças a uma conversa realizada junto à Vimer, Bazaar e outros criadores pretes, conseguimos que um grande número de empresas troque o termo Black Friday pra Best Friday, a partir desse ano. Nossos integrantes, por intermédio da Célula, também conseguiram destaques individuais como a Dendezeiro e Jal Vieira, que se tornaram colunistas da FFW, onde trazem destaque para outros profissionais pretos. A ideia é impactar a indústria em geral, discutir a mudança e a necessidade dela.
SdA – Quais serão as principais frentes de trabalho da CP? Existe um cronograma de ações?
HS – Com tudo digital, ainda está muito incerto. Estruturar um coletivo não é fácil, ainda mais em tempos de pandemia quando nunca tivemos uma reunião presencial. Alguns de nós, inclusive, nunca nos vimos pessoalmente, mas nos cobramos muito para essa visibilidade ser repassada em toda a cadeia da moda para outros profissionais pretos e que consigamos fortalecer essa rede para além de nós. Trazendo mais profissionais pretes para lugares de destaque, em todas as áreas de atuação.
SdA – Se vocês pudessem dar um conselho para um estilista preto, periférico e que não tem grandes recursos para começar o seu próprio negócio, qual seria?
Não desista. As coisas têm tendência a se tornarem confusas, mas grandes ideias vêm também com grande dedicação, amor e confiança. A união é algo que sempre vai ser necessário tanto no nosso desenvolvimento no trabalho, quanto na nossa vida em geral. Por isso nasceu a Célula, da necessidade do suporte aos nossos iguais. Então, ajude quem está ao seu redor, crie uma rede de conexão, de trocas e de aprendizado.
O PAPEL DO PÚBLICO CONTRA O RACISMO DA MODA
Ações afirmativas, segundo André, deverão ser cada vez mais comuns. E elas são importantes para que o público em geral reconheça o talento de profissionais diversos de maneira clara, quase que didática. “Nunca se produziu tanta coisa boa, bacana e diversa na moda antes. Isso é incrível”, diz.
E o consumidor tem papel fundamental na valorização de estilistas negros. Para ele, algumas simples ações podem transformar o cenário brasileiro.
- Seguir nas redes sociais, pesquisar e conhecer o trabalho destes profissionais
- Comprar seus produtos e incentivar negócios de estilistas pretos, indígenas, trans, etc.
- Divulgar estes trabalhos e indicar para outras pessoas
- Se você for produtor ou empresário, contratar estes profissionais e ajudar a promover a equidade
- Ser antirracista, sempre!
Amei e quero fazer parte da CP! Parabéns!!