Criatividade, moda e processo criativo: é possível criar em tempos pandêmicos?
Bia Vianna desvenda os mistérios do processo criativo e explica como períodos difíceis podem ser férteis para encontrar soluções.
Em meio a essa “quarentena” (que parece infinita), muitas vezes nos vemos carentes de tantas coisas, sem foco, ânimo ou criatividade.
A criatividade vem sendo estudada há anos e já foi dito que “é o processo que resulta em um produto novo, que é aceito como útil, e/ou satisfatório por um número significativo de pessoas em algum ponto no tempo” (Stein, 1974). E que é quando “manipulamos símbolos ou objetos externos para produzir um evento incomum para nós ou para nosso meio” (Flieger, 1978). Para citar uma definição mais poética, uso a de Sanches, em 2003, que se referiu em seus apontamentos que ”a criatividade é uma sublime dimensão da condição humana.”
Sem dúvida, criar é uma capacidade humana de valor imensurável. Recentemente, um artigo da Universidade de Granada, na Espanha, afirmou que os genes ligados à criatividade deram a nós, humanos, a vantagem de que precisávamos para sobrevivência da espécie. O estudo alega que foram encontrados 267 genes ligados à criatividade e que isso foi o nosso trunfo.
Ainda não se tem, e talvez não seja mesmo este o objetivo, um conceito único que descreva o termo criatividade, mas diariamente usamos dela para soluções de problemas, inovar em algum padrão já existente e criar arte, entretenimento e moda.
Criação X Repertório
A criatividade mexe com o cérebro inteiro, inclusive acionando a memória. A criação de algo acontece a partir de uma bagagem cultural e de conhecimento. O que quero dizer é que não é sobre criar algo do nada, mas ser único no uso da sua bagagem individual em sua criação.
Quanto antes começamos a praticar a criatividade, aliando a prática ao acesso à cultura, à arte e ao conhecimento, potencializamos o desenvolvimento do processo criativo e de inovação em nós. O ideal é colocar a criatividade no centro de todas as matérias que aprendemos na vida escolar e acadêmica e unir aos nossos sentidos e emoções. Todas as experiências se tornam material essencial para o cérebro criar.
A dor e a delícia do processo criativo
Na moda, e talvez em várias profissões em que o trabalho criativo é reconhecido, muitas pessoas são curiosas sobre os processos dos grandes nomes da criação. Como comentei, tudo começa por um caminho pessoal, de uma bagagem adquirida pelo indivíduo. Porém, do ponto de vista neurocientífico, temos como melhor aproveitar essas redes neurais formadas por meio desse repertório que adquirimos.
“Nós vemos com olhos, mas também com o cérebro. E ver com o cérebro é, normalmente, chamado de imaginação.” Oliver Sacks. Tudo começa com a imaginação, que é também definida no dicionário pela palavra c r i a t i v i d a d e! Ver com o cérebro, imaginar, é uma das coisas que só o ser humano faz, por meio de um sistema cerebral muito sofisticado. É por causa da imaginação que podemos sobrepor nosso instinto de ir pela via mais fácil e considerar nossas opções, antes de tomar uma decisão.
No processo criativo, o uso da imaginação é essencial para criar algo que ainda não existe, por isso, precisamos estar tão atentos ao nosso repertório. Nesse processo, nosso cérebro molda os estímulos e bagagens que temos, fragmenta e faz uma nova combinação. Significa unir coisas já vistas de forma nunca vistas para criar algo novo.
Neste caso, é preciso respeitar as etapas. Podemos, inclusive, nos inspirar no ciclo de plantio e colheita do algodão, já que cada etapa ali acontece na hora certa. É sobre canalizar sentimentos, se sentir conectado com o mundo, começar uma conversa consigo ou com quem você cria para. Muitas vezes, criar algo pode ser uma agonia e ficar confuso faz parte do aprendizado.
Algumas coisas que já sabemos como importantes no processo, além do repertório e estímulos, é que a ideia ou resposta que procuramos, normalmente, vem até a gente em momento de relaxamento; e que é importante criar um ambiente propício para criação.
É possível ser criativo durante a pandemia?
A criatividade é parte do ser humano, fazemos sem nem perceber. Porém, para a realidade de quem trabalha com criatividade com curto prazo e muita pressão, é, sim, desafiador passar por esse processo – seja em momentos como o atual ou em qualquer outro. Isso também porque, para passarmos pelo processo criativo, é preciso aceitar possíveis falhas.
O neurocientista David Eagleman, que é também escritor do livro ‘Como o cérebro cria’, listou 3 coisas que podem nos ajudar neste momento, ou em qualquer outro de dificuldade. Ele começa dizendo que criatividade acontece quando saímos do caminho mais fácil e tentamos algo novo. Seja nas grandes ou pequenas coisas da rotina, mudar a escolha óbvia cria novas conexões no cérebro. Sua segunda dica é transpor limites, os seus próprios! Explorar e esgotar as possibilidades, para entender o que é possível. E nesse caminho é importante encarar o erro como algo que irá acontecer e tornar ele o seu professor, por isso, a última questão que ele aborda é ‘não tenha medo de errar’.
A criatividade tem um poder curador e não é à toa que é usada como parte de terapias. Talvez, para o criador, o primeiro passo seja ressignificar a forma que se relaciona com a criatividade e não deixar que esse diálogo se restrinja ao trabalho. Por isso, busque estímulos que façam sentido para a totalidade de quem você é. Ainda, é importante considerar que quanto mais sabemos como nosso cérebro cria, mais devemos buscar moldar o sistema para este processo.
TEXTO MARAVILHOSO… que possamos sair mais fortes desse momento confuso da história, que a pandemia possa nos mostrar novas possibilidades e oportunidades.
Texto lindíssimo com uma explicação clara sobre Criatividade que me levou a crer que eu, com 71 anos ainda posso criar, através do meu cérebro que cria uma imagem…
Parabéns Bia Vianna!!!!