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algodão & sustentabilidade

Mulheres de Fibra – Histórias de Goiás

18 de maio de 2018 | 0

Março foi um mês dedicado às mulheres, e trouxemos algumas das valiosas histórias de mulheres de fibra, que vêm transformando o cenário da cotonicultura com sua atuação. Este mês trazemos mais algumas dessas experiências inspiradoras, mostrando que elas também têm espaço cativo num ambiente onde ainda predomina a presença masculina.

Duas gestoras de Goiás, trabalhando ativamente na sucessão das empresas familiares, com muito esforço e estudo, preocupada com o futuro e com a sustentabilidade dos negócios.

 

Nathalia Borges

A economista Natália Rezende Borges é economista graduada em Finanças, pelo Certificates in Financial Management, no Insper, em São Paulo. Trabalha nas fazendas da família desde 2012. Criada em terras de plantio, aprendeu desde cedo a ter uma admiração profunda pelo trabalho de seu pai, o agricultor Elmiro Vieira Borges.

Ainda que tenha ido para São Paulo estudar, sabia que o seu destino estava traçado: herdaria a gestão dos negócios e substituiria o pai à frente das terras da família – o que para ela é um prazer enorme.

“Começamos a plantar algodão em 2006, e seis anos mais tarde montamos nossa algodoeira para o beneficiamento. Foi quando eu comecei a trabalhar no grupo”, conta.

Sob a regência de Nathalia, estão duas fazendas em Goiás, nos municípios de Perolândia e Mineiros, ambas no sudoeste do estado e a cerca de 4 horas da capital. Nelas, trabalham cerca de sessenta funcionários e, além de algodão, há também o cultivo de soja, milho e feijão. Após o beneficiamento, quase toda a pluma vai para os estados de São Paulo e Paraná. O caroço é vendido para empresas de ração animal localizadas na cercania das fazendas.

Cuidando dos pilares de sustentabilidade

Além da parte financeira e da comercialização, o trabalho de Nathalia se estende ao campo, onde ela controla os processos de produção. “Como sou responsável por apontar o custo por hectare, por exemplo, monitoro tudo o que é usado no plantio para valorar investimentos e lucros”.

Outra atividade é a manutenção da certificação ABR (Algodão Brasileiro Responsável) das fazendas, o que, segundo ela, é bastante trabalhoso devido à quantidade de itens que precisam ser acompanhados para que as exigências do programa sejam atendidas. “Nós fazemos o treinamento dos funcionários, um dos requisitos do selo ABR. E é muito importante. O pessoal do campo tem de estar treinado até pela questão da segurança, para o manejo correto dos equipamentos e dos produtos utilizados na lavoura”, explica.

Ela tem razão, oferecer segurança ao trabalhador é uma premissa da certificação ABR, e dá trabalho controlar todos os acessórios e equipamentos necessários. Aquela imagem do agricultor com camisa xadrez e chapéu de cowboy, pilotando um trator com meio corpo para fora do veículo, é cena de novela. Nos dias de hoje, as medidas de segurança exigem que o trabalhador use os paramentos adequados que proporcionem proteção em todas as situações de trabalho. “O uso de equipamentos de proteção é absolutamente controlado: eles assinam a ficha de controle na retirada e na devolução”. Tudo de acordo com as normas brasileiras de trabalho.

 

A fibra no Brasil

A economista acredita no que faz e vê com bons olhos o apoio de associações que ajudam o plantio da fibra no Brasil. “Eu avalio que os que estão hoje no negócio do algodão conseguem fazer algo bem profissional. É uma cultura cujos custos são altos, mas o retorno em si é um pouco maior do que o de grãos”, comenta.

Entusiasmada com o algodão responsável, ela vê o programa ABR como um ótimo sinalizador de que a produção profissionalizou no país, que hoje é um ponto de excelência para a agricultura, e diz que sente isso nos produtores. “Todo agricultor com quem converso é um apaixonado pela fibra e por sua cultura”.

Uma das associações que apoia firmemente o cultivo dessa commodity é a Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão), que, além de todas as atividades que mantém em prol da pluma, criou o movimento Sou de Algodão, voltado para o incentivo do uso da fibra na moda. Sobre isso, Nathalia não economiza comentário: “É um movimento fantástico, pois ao mesmo tempo em que ele evidencia a qualidade da matéria-prima brasileira, coloca o algodão em destaque, como uma opção de cultivo à frente de outras culturas. E mostra que o produtor rural tem essa preocupação com as boas práticas, sem agredir o meio ambiente, a questão social, sem o trabalho análogo escravo. Não somos o quinto maior produtor mundial por acaso, e devemos acreditar que esse movimento é mais um trabalho pela cotonicultura brasileira”.

 

Por uma transição suave entre gerações

Embora já esteja à frente dos negócios, Nathalia ainda trabalha o processo de transição definitivo. Ela explica que com “seu Elmiro” isso é bastante tranquilo, mas que nem todos os casos são assim. A economista participou de um curso chamado Academia de Líderes Sucessores, uma espécie de MBA (Master of Business Administration), com duração de dois anos, em Brasília (DF), voltado para jovens que vão herdar os negócios da família, e que a ajudou a identificar vários pontos importantes para essa passagem.

Segundo explica, o desafio é justamente o de ser visto como a nova geração que quer mexer em uma estrutura já montada. “A discussão da sucessão é muito sensível, porque eles -os pais- não gostam. Muitos têm resistência, acham que nós -os sucessores- queremos aposentá-los, e na verdade não é isso. A gente precisa, como todo negócio, de uma transição. Mas quando existe um choque de gestão muito grande, significa que o processo não foi suave, que não aproveitou o know-how da antiga geração, e que houve perdas”.

Sobre a presença feminina no comando de fazendas, Nathalia acha que é um movimento em crescimento, embora, no campo mesmo, essa presença ainda seja mínima. Na parte administrativa de suas fazendas, as mulheres são maioria, e representam 55% dos funcionários. Em seu caso específico, a aceitação de uma chefe mulher foi rápida, até porque boa parte dos trabalhadores já a conhecia desde criança. Mas não nega que também existem obstáculos. “Não só por ser mulher, mas por ser filha do dono. É o grande desafio da nova geração, pois está entrando para gerir o negócio. E isso é comum nas empresas familiares. O meu papel hoje é alavancar os nossos negócios com o algodão, profissionalizando a gestão”, observa.

 

Bruna Zapparoli

Outra gestora com raízes no plantio da fibra é Bruna Zapparoli. Jornalista de formação, optou por dar continuidade aos negócios familiares, onde cresceu vendo as lavouras. “Desde pequena tive contato com a fibra, nossa família sempre teve fazenda e plantava algodão. Fomos um dos pioneiros nessa atividade na região, e a primeira algodoeira instalada em Chapadão do Céu, a 490 km de Goiânia (GO), é da minha família”.

Bruna começou a trabalhar com o pai em 2011, após se formar. Ela é gestora de duas fazendas: uma em Chapadão do Céu, em Goiás, e outra em Alto Taquari, a cerca de 500 km de Cuiabá, no Mato Grosso. Em ambas há plantação de algodão, soja e milho. “Sou gestora do negócio, mas faço de tudo. Só não trabalho diretamente na terra. Recentemente também comecei a assumir a parte comercial”.

Além das terras, Bruna comanda 45 funcionários, que são fixos mesmo durante as entressafras. No entanto, no período de safra, esse contingente triplica, para atender a produção que, muitas vezes roda em dois turnos. Em época de colheita, esse número sobe bastante, sobretudo porque a algodoeira exige mais trabalhadores. “Temos duas algodoeiras, uma em cada fazenda. Muitos safristas (pessoas que atuam de forma temporária no período das safras) trabalham conosco há muito muitos anos. Eles vêm para cá durante as colheitas, trabalham por cerca de três meses, depois voltam para suas cidades, seus sítios, e vivem o resto do ano com o que ganham no trabalho que exercem na algodoeira”, explica.

A respeito do movimento Sou de Algodão, ela afirma considerar a iniciativa muito importante, pois acredita na valia do incentivo para que as pessoas usem roupas feitas com a fibra. “Há tanto tecido sintético feito de petróleo, de plástico, que não são biodegradáveis, sustentáveis. E o algodão é natural, a roupa é muito confortável”, completa.

 

Cooperativas

A gestora vê com bons olhos a participação de fazendeiros em cooperativas. Ela própria é cooperada da Coopercotton (Cooperativa de Cotonicultores de Mato Grosso). “Participar de cooperativa é muito rico porque você ganha volume, tem poder de discussão, acaba tendo uma representatividade”.

E isso fortalece a presença das mulheres à frente das fazendas. “Nós já somos muitas no agronegócio, mas ainda estamos mais no escritório. Os cargos de gestão registram um número grande mulheres, já nos cargos operacionais essa atuação é menor, muito por ser ainda um ambiente dominado por homens, por ser um trabalho mais pesado, sob o sol. Mas a presença feminina está crescendo”.

A transição da gestão das fazendas do pai para Bruna continua em andamento, mas ela já se sente preparada. “É um desafio, há muita pressão, muita gente, muitas áreas, mas eu gosto, sou feliz assim”.

A gestora ainda sente um pouco de dificuldade em alguns processos pelo fato de ser mulher, na hora de tomar decisões, por exemplo. Ela explica que, pelo fato de o agronegócio ser um reduto masculino, parte dos fazendeiros ainda fica receosa, quando tem de negociar ou receber orientações de uma mulher, mas considera também que essa é uma questão que permeia o mercado como um todo.

Outra dificuldade é a jornada dupla. “A gente trabalha o dia inteiro e, quando chega em casa, tem muitas coisas para fazer. No agronegócio nós também não temos apoio dos homens no trabalho doméstico. Aqui sou eu quem dirige a casa, todas as decisões são minhas”.

 

Produção da fibra no Brasil

Apesar de todos os desafios, Bruna vê com entusiasmo e como vantajoso o trabalho no agronegócio. Em sua opinião, além de ser uma atividade importante, o setor emprega muita gente, paga bem e registra uma circulação grande de dinheiro. Mas acrescenta que os resultados demandam estrutura.

“Hoje, plantar algodão e não ter algodoeira não vale a pena, porque ela é um instrumento de trabalho. Foi-se o tempo em que essa instalação era um negócio. Atualmente, o preço da fibra somado ao preço do caroço é que tornam essa produção atrativa”.


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